29 de out. de 2007

1408


Stephen King é um excelente contador de histórias. Seu grande mérito é não depender de cenários lúgubres ou circunstâncias extraordinárias para criar uma boa e envolvente história de horror. E talvez suas tramas sejam tão arrepiantes justamente por serem ambientadas em cenários urbanos e cotidianos. Mas King também é um dos escritores mais injustiçados pela sétima arte. Apesar da absurda quantidade de adaptações de seus contos e romances, são poucas as que fazem jus ao original. Ironicamente, as melhores transposições vieram daqueles que não têm nada a ver com horror, como foi o caso de Um Sonho de Liberdade, Conta Comigo e À Espera de um Milagre.

1408 é adaptado de um conto de mesmo título que, por sua vez, foi inspirado numa reportagem sobre um quarto mal-assombrado num hotel da Califórnia. Nunca li esse conto específico, mas o enredo do filme guarda diversas semelhanças com uma das obras mais famosas de Stephen King, O Iluminado. Mais uma vez, o horror em sua forma absoluta emanando de um local prosaico, luxuoso até. Só que, em vez do imenso Hotel Overlook, agora tudo se concentra num quarto. Conhecendo o humor peculiar de Stephen King, isso pode até ser algum tipo de piada - hotel inteiro para um romance, apenas um quarto para um conto.

Mike Enslin escreve sobre lugares mal-assombrados, embora ele próprio não acredite em fantasmas. Debochado a ponto de dar cotações em caveirinhas segundo o grau de “assustabilidade” de um local, Mike nunca encontrou evidências reais em nenhum dos locais visitados. Até o dia em que decide ir ao Dolphin Hotel e passar uma noite no supostamente amaldiçoado quarto 1408. O gerente do estabelecimento interditou o quarto há anos e faz de tudo para fazê-lo mudar de idéia, mas Mike está ciente de seus direitos de consumidor e exige ocupar o quarto.

Seguindo um tema recorrente do autor, a força maléfica que comanda o local é como um organismo vivo. O interessante paradoxo da história é o fato do 1408 não ser nocivo por algo feito por humanos - um assassinato, uma morte trágica -, como ocorre na maioria dos longas de terror. Ao contrário, é o Mal, em sua essência, que transforma as pessoas. Esse aspecto é muito interessante, ao menos para quem aprecia histórias de terror e está cansado de menininhas orientais de longos cabelos molhados. Todo o clima no hotel leva a um permanente estado de tensão e antecipação da próxima cena, com destaque para o ótimo embate entre Mike e o gerente do hotel. O filme aposta naquele tipo de suspense que vem do fato do espectador já ter uma idéia do que vai acontecer (alguma dúvida de que Mike vai comer o pão que o diabo amassou dentro do tal 1408?), enquanto o protagonista permanece na santa ignorância. Pior ainda, no descrédito.

O maior acerto de 1408 é ter em cena o tempo inteiro o eficiente John Cusack. Cusack é daqueles atores que conferem credibilidade a um filme, com aquele jeito familiar e largadão que parece o seu melhor amigo dizendo “ei, cara, sou eu quem está contando essa história”. E você, espectador, acredita nele.

Até certa altura, descontados alguns cacoetes desnecessários do gênero, o filme se desenvolve muito bem. A maior decepção ocorre no momento em que o roteiro cai num dos truques mais preguiçosos sempre que um autor não sabe como explicar o inexplicável. Fiquei furiosa. Mas aí olhei para o relógio e percebi que ainda faltava um bocado de filme. Ufa! Aquilo que estava ocorrendo não era conclusivo. O que vem depois dá uma recuperada e pode até ser engenhoso, mas a essa altura já estava instalada a sensação de interrupção no meu envolvimento com a história. Acabada a projeção, a impressão que fica é a de que 1408 é uma história esticada além do necessário. O que faz sentido se considerarmos que o roteiro foi escrito tendo um pequeno conto como base.

O filme estréia nesta sexta (bem apropriado estrear no dia dos mortos, vocês não acham?).

Ficha de 1408 no Adoro Cinema

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