Scarlett O’Hara, depois de muito esnobar Rhett Butler, entende que o ama. Mas é tarde demais. Ela corre atrás dele e pergunta o que vai ser dela, se ele a deixar. Butler - ou melhor, Clark Gable - dispara o petardo: “Francamente, minha querida, eu não ligo a mínima”. Osgood, milionário mulherengo, não mede esforços para fazer de Daphne sua enésima esposa. Mas Daphne é Jerry que, após muitas trapalhadas, arranca o disfarce e mostra ao insistente conquistador porque não pode se casar com ele. Sereno, Osgood sentencia: “Ninguém é perfeito”. Rick e Ilsa vão se separar mais uma vez e provavelmente nunca voltarão a se ver. Na neblina do aeroporto, ele tenta convencê-la de que o amor deles não tem futuro com a marcante: “Se você não entrar naquele avião, se arrependerá. Talvez não hoje, nem amanhã, mas logo e pelo resto da sua vida.”
As cenas citadas acima são, respectivamente, de … E o Vento Levou, Quanto Mais Quente Melhor e Casablanca. Qual a correlação entre elas? São cenas inesquecíveis, que já têm lugar cativo no imaginário coletivo e há muito extrapolaram os limites do filme de origem. A famosa seqüência de Gene Kelly sapateando sob a chuva, embora seja uma das mais empolgantes de todos os tempos, nem faz lá muita diferença para a trama de Cantando na Chuva. Mas é adorada por pessoas que nunca viram o filme e não têm a mínima idéia de seu enredo. Que, diga-se de passagem, é uma verdadeira aula sobre a história da sétima arte, já que detalha todo o processo da transição do cinema mudo para o falado.
O cinema atual também produz todos os dias seqüências memoráveis, embora seja necessário o crivo do tempo para determinar o que vai entrar para a posteridade. Existem alguns exemplos recentes que já se tornaram clássicos indiscutíveis. Destaco três, bem diferentes entre si, mas que já entraram para a história da sétima arte:
Em Cidade de Deus, o personagem Buscapé entende o significado exato do ditado “se ficar o bicho pega, se correr o bicho come” no instante em que, armado apenas com sua máquina fotográfica, fica exatamente no meio da batalha iminente entre o bando de Zé Pequeno e a polícia. A câmera faz um giro completo e vertiginoso, numa das tomadas mais famosas (e copiadas) dos últimos anos.
I see dead people. A força da confissão sussurrada do pequeno Haley Joel Osment em O Sexto Sentido é tão poderosa que a frase chega a dispensar a tradução “eu vejo gente morta”, sendo prontamente entendida até por quem não fala uma palavra de inglês. Apavorado, exalando fragilidade sob um cobertor, o menino revela o que já sabíamos mas, ainda assim, não queríamos ouvir. O espectador ainda está sob impacto da fala anterior quando vem seu complemento. Com que freqüência isso acontece? All the time (o tempo todo).
Pulp Fiction é um filme repleto de cenas célebres. Mas nenhuma supera John Travolta e Uma Thurman dançando um estranhíssimo twist (ou seja lá o que for aquilo) numa ainda mais estranha lanchonete. Ele, meio balofo e desconjuntado, começa tímido e depois se solta pra valer ao som de You Never Can Tell. Ela, super feminina de terno, esbanja graça e elegância. O gesto do casal de fazer um V com os dedos médio e indicador e passá-los na frente dos olhos é copiado em pistas de dança até hoje.
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